Torcedor de futebol, ao invés de comprar jogadores, por que seu time não contrata gestores competentes?

23 de janeiro de 2014
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Sou um aficionado do futebol e o meu time, como o de todo mundo, me proporciona momentos de alegrias e tristezas.  Como todo apaixonado, enxergo muito mais as qualidades do que os defeitos. Aqui não vou falar com paixão e sim com a razão sobre o negócio futebol.

Temos visto de forma cada vez mais frequente que o que define a boa ou a má temporada começa bem antes do início do campeonato e fora das quatro linhas. Estou falando de gestão profissional, com aplicação cada vez maior das técnicas de gestão aplicadas nas empresas privadas.

Os clubes de futebol, cujos dirigentes não atentarem e principalmente praticarem a gestão profissional, estarão fadados ao fracasso muito em breve.

Para que isso não ocorra, mudanças na legislação e na gestão dos clubes precisam acontecer rapidamente. Penso que enquanto os dirigentes dos clubes não forem responsabilizados pela perda de patrimônio durante sua gestão, não faremos grandes progressos.  Do lado dos clubes, a ideia aqui é dar alguns conselhos.

 

O mercado do  futebol

Há tempos, o futebol é um negócio e todo negócio tem seu mercado que, no caso do futebol, se transformou muito no passado recente.  Antes, dentro de campo, os atletas atuavam como amadores, com paixão pela camisa e pela comunidade que o acolhia e que cobrava a famosa garra em campo. Fora de campo, a paixão dos torcedores nunca mudou e se antes um jogo de futebol era um lazer circunscrito ao bairro, a uma região ou a uma cidade, visto por poucos como uma peça de teatro ou um espetáculo circense, hoje isso é muito diferente.

O mercado do futebol é o do entretenimento em massa, estimado em mais de US$250 bilhões, e entrou – graças à TV e ao marketing – no seleto circuito dos grandes shows da mídia internacional.

 

O negócio do futebol

Por certo, o futebol não é uma “caixinha de surpresas” como afirmavam jogadores, dirigentes e comentaristas antigos, mas por certo é um negócio diferente de outros negócios em muitos aspectos.

Antes do entretenimento, torcedores de futebol como eu e você, querem ganhar primeiro e se divertir depois.  Assim, de forma frequente, a lógica e a prudência muitas vezes dão lugar à paixão que não mede as consequências de ações presentes.

Alguns clubes de futebol possuem uma representação social e às vezes política marcante. O Barcelona é um exemplo típico ao representar toda a região da Catalunha e tudo o que isso significa politicamente na Espanha.  Com toda essa carga emocional, muitas vezes a falta de um título importante em um momento político específico vai valer mais do que a prudência financeira.

 

A avaliação no futebol é muito mais dura do que em uma empresa

Sucesso

Nas empresas, o sucesso é medido pelo retorno financeiro proporcionado aos acionistas e ele vem quando os clientes estão satisfeitos com o produto. No futebol, a primeira métrica de sucesso diz respeito às vitórias e principalmente aos títulos ganhos, e depois se der, soma-se o resultado financeiro.  A satisfação do consumidor nem sempre indica retorno financeiro.

Não há o famoso ganha-ganha no futebol, como existe nos negócios entre empresas.  Existe sim vitória ou derrota, já que o empate tem sempre um sabor de vitória ou de derrota diferente, dependendo de cada time ou torcedor.

Eu particularmente penso que se os dirigentes aplicarem  as boas técnicas de gestão, a probabilidade de sucesso esportivo e financeiro aumenta bastante.

Avaliação jogo a jogo e pública

Se na empresa a avaliação de resultados é trimestral ou anual para um grupo restrito de gestores ou acionistas, no futebol a avaliação é jogo a jogo.  E o que é pior: aos olhos de todo mundo que se julga conhecedor o suficiente para dar palpites e criticar de forma veemente.

Os trabalhadores ficam com a maior parte do bolo

No futebol, existem cinco grandes participantes do mercado que são os jogadores, as Ligas e Federações, os Clubes, os Patrocinadores e a Mídia.

A maior parcela do faturamento vai para os trabalhadores, isto é, os jogadores. No futebol, a máxima de que o principal ativo numa empresa são as pessoas é real e, portanto, cara. Diferente de outros negócios, os jogadores ou trabalhadores do futebol são jovens e nos grandes clubes têm média salarial de fazer inveja até ao presidente de grandes empresas. Isso os deixa com ego enorme e às vezes com manias, presunção e muito poder.

A TV e a mídia compram dos clubes e das federações os direitos de transmissão das partidas a preços bem salgados, graças a uma boa audiência gerada pelo futebol.  Ela vende aos patrocinadores as cotas publicitárias de transmissão.

As Federações ficam com uma parte importante do dinheiro e geralmente só têm a responsabilidade de organizar os campeonatos e as seleções nacionais com atletas dos clubes que quando estão servindo a seleção continuam sendo regiamente pagos pelos clubes de origem, que correm o risco de ter seus atletas contundidos  e nada podem fazer.

 

Três fontes de Receita

No negócio futebol, existem três fontes de receita: proveniente de venda de ingressos, de direitos de transmissão e de marketing.

Ingressos – Foi-se o tempo em que se lotava o Maracanã com mais de 100 mil pessoas. Hoje em dia, prefere-se ter estádios menores, mais confortáveis e com preços bem mais altos e diferenciados por localização e tipo de partida. A ideia é reduzir a oferta de lugares, diferenciar por acomodações melhores e, com isso, provocar a escassez de ingressos que leva a preços e lucros maiores.

Direitos de transmissão – Aqui a lógica beneficia os grandes clubes que trazem maior audiência e os times menores não conseguem obter muito dinheiro através dos direitos de transmissão.

Marketing – Diz respeito à renda recebida de patrocinadores pela venda de material oficial do clube com merchandising e jogos amistosos.  O marketing, principalmente para os grandes clubes, é o de maior potencial de crescimento de receita à medida que o time vai se tornando mais conhecido e global, podendo explorar sua imagem mundialmente, trazendo com isso torcedores do mundo inteiro, patrocinadores multinacionais, transmissões globais e merchandising de todo o planeta.

 

Três tipos de Despesas

Do lado das despesas, os salários dos atletas, a amortização de investimento em atletas e as despesas operacionais  compõem as despesas de um clube de futebol.

Salários – Tradicionalmente, os estudiosos afirmam que os salários devem corresponder a no máximo 65% da receita total de um clube de ponta, com grandes jogadores e capaz de disputar títulos importantes. Apenas os times grandes conseguirão se manter nesse patamar e daí a importância de uma boa gestão.

Nas empresas modernas, parte da remuneração de executivos e funcionários está associada ao resultado alcançado pela empresa. No futebol, essa prática tem ganhado adeptos recentemente com relativo sucesso e, é claro, um certo  descontentamento dos jogadores.

Amortização – Quando o clube adquire um atleta, ele tem que amortizar o investimento por um período, normalmente o prazo do primeiro contrato. Este pode ser um custo alto, principalmente se o clube pagou um bom dinheiro por este atleta. Se o jogador tem sucesso e ganha títulos, o investimento se paga. Se você forma atletas no clube, os custos de amortização tendem a ser bem menores.

Despesas Operacionais – É o menor item entre as despesas e correspondem às despesas de manutenção da estrutura, das dependências, de material, de transporte etc.

 

O Futuro

Não dá mais para administrar os clubes como amadores. Os clubes de futebol são multinacionais e como tal devem ser administrados  por profissionais competentes, empregando as melhoras ferramentas de gestão nas finanças, no marketing e nos craques, ops,… quero dizer, nos recursos humanos.

Torcedor, torça para seu time contratar os melhores gestores, e aumentar as chances de seu time ganhar mais títulos!

 

Clayton Nogueira. Diretor financeiro para a América Latina da Valspar Corporation. Mestre em Controladoria pela USP. MBA em Marketing pela ESPM-SP. Graduado em Administração de Empresas. Professor de Planejamento e Controle na FIAP e na FIA-USP. Conselheiro fiscal e de administração certificado pelo IBGC. Conselheiro fiscal da Abrafati. Diretor vogal no IBEF-SP

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