Reprograme seu chip mental: Colaborar gera valor

2 de fevereiro de 2015
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Colaboração não deveria ser mais uma palavra batida no nosso vocabulário e sim um verbo ativo que nos lembramos de exercitar todos os dias

 

Nathalie Trutmann*

Que tal começar o ano com esta frase. Infelizmente ela não é minha e sim da  brilhante e generosa Maria Mujica, diretora de marketing para América Latina da Mondelez, idealizadora do Fly Garage, em Buenos Aires (mais infos http://flygarage.net). Decidi adota-la como uma das minhas afirmações de 2015 porque meu ano começou com uma conversa que me fez refletir muito. Há poucos dias, me encontrei com um executivo de marketing de uma grande multinacional e nossa conversa teve início com os clássicos dilemas das organizações hoje: as dificuldades de implementar iniciativas dentro da empresa e a enorme discrepância na forma de trabalhar entre os funcionários das diferentes gerações.

“Veja só como são as coisas, recentemente uma dessas meninas da geração mais jovem da minha equipe pediu demissão e alguns dias depois me procurou para perguntar qual seria o valor de sua rescisão. Na hora, imaginei que ela queria fazer as contas para ver por quanto tempo poderia ficar sem procurar emprego. Mas não, o que ela queria saber era quanto tinha para planejar o valor que iria doar à causa que apoia”. Comentei com ele que sua história me fez lembrar do livro recente que li, “Money: Master the Game”, de Anthony Robbins, onde uma das coisas que ele enfatiza é a importância da pessoa começar a doar um percentual de sua retirada desde o começo de sua carreira. “Se você não doa 10% de seu salário quando você ganha R$ 1 mil, não irá doar 10% quando ganhar R$ 1 milhão”. O autor explica que o valor desta ação é muito importante, não pelo montante envolvido, mas pela poderosa mudança que ele causa na estrutura do nosso pensamento, levando-o de uma posição de ‘medo da escassez’ para uma de ‘confiança na abundância.’

Em outras palavras, praticar um percentual de doação ajuda a reprogramar nossa forma de pensar e exercita nossa mente a acreditar (bem além de só intelectualizar) que de fato temos o suficiente e que existe mais além daquele momento ou oportunidade. E refleti sobre como a falta dessa ‘confiança na abundância,’ e do exercício de pratica-la talvez seja a razão pela qual a maioria das nossas interações sejam tão precipitadas e egocêntricas. Se não acreditamos que temos o suficiente porque vamos fazer uma pausa para ajudar ao outro?

Quando estamos funcionando sob o modus operandi de escassez não temos como fugir dessa correria sem fim sobre a qual nunca temos nem o tempo nem o dinheiro suficiente para pensar além do nosso próprio umbigo. Mas o que isso tem a ver com uma organização e seus os objetivos? Muito mais do que se imagina, ainda mais que uma das palavras em voga hoje em dia – e que já alcança os mesmos níveis de desgaste do conceito inovação – é colaboração. Ninguém quer mais ir a um curso ou palestra para ouvir que colaboração ou trabalho em equipe é importante. Ninguém quer gastar seu tempo com algo tão óbvio.

Mas será que de fato praticamos uma colaboração genuína no nosso dia a dia? Não se trata mais apenas de colaborar dentro das nossas empresas com colegas atrelados a nossas metas, mas sim com o ecossistema como um todo. Até bem pouco tempo atrás, uma grande empresa poderia se permitir o luxo de atuar como se fosse uma enorme ilha e ignorar um concorrente pequeno. Porém, hoje essa não é mais uma estratégia saudável e muito menos visionária. O pequeno pode virar grande e o grande virar pequeno num piscar de olhos. Para quem tem alguma dúvida nesse sentido é interessante dar uma olhada no novo livro do Salim Ismail, “Exponential Organizations”. Waze e Airbnb não são mais casos isolados, e sim novos modelos de negócios estruturados a partir da colaboração com o explosivo ecossistema interligado que as tecnologias e a sociedade em rede nos oferecem. Em um mundo onde a velocidade das conexões se exponencializa a cada segundo, não há mais a opção de agir como uma ilha ou sob uma verdade absoluta nem dentro nem fora de uma empresa.

O tal do capital social é real e cada vez a moeda mais poderosa nas nossas bolsas. Só que ele não é gerado por meio de likes e mensagens patrocinadas. Ele é gerado por meio da entrega de valor real, um dos benefícios laterais (além da mudança do nosso chip cerebral) que a tal da colaboração produz. Ela não deveria de ser mais uma palavra batida no nosso vocabulário e sim um verbo ativo que nos lembramos de exercitar todos os dias. Em vez de desperdiçar a água do chuveiro, reutilize-a. Em vez de adiar uma ligação na qual você não enxerga um benefício direto, tome os 5/10 minutos que ela requer e faça-a.

Experimente ressuscitar o significado dessa palavra em cada ação e decisão que você toma no seu dia a dia e observe o que acontece. No pior dos casos, talvez sua ilha pessoal comece a se expandir e tocar outras ilhas. Talvez você comece a ressuscitar uma outra palavra também igualmente batida pela qual nenhum de nós hoje pagaria para reconstruir as conexões neurológicas adormecidas em torno dela: ecossistema.

Resumindo tudo numa equação: Doar regularmente (tempo e dinheiro) = Reprograma nosso chip mental para um de confiança na abundância = Gera colaboração genuína = Valor + Eficiência + Ecossistema saudável e poderoso. No final das contas, não é isso o que toda organização quer?

Costumo ser procurada com uma certa frequência por profissionais insatisfeitos com suas carreiras estagnadas, e trabalhos sem propósito, querendo tomar o famoso cafezinho. Também, pelo meu trabalho, costumo conversar com os líderes das empresas onde esses mesmos funcionários se sentem desmotivados e ouvir muito como essa nova geração é difícil de gerenciar. A questão é que o jeito ‘dessa geração’ não é mais só ‘dessa geração’ – essa tendência, por exemplo, por trabalhos com causas reais, que tenham impacto na vida de outros está pingando nas outras gerações. O sentimento de fazer parte da algo maior é uma das maiores necessidades humanas e o custo real dessa falta de confiança e colaboração, são funcionários e equipes desmotivados produzindo bem menos do que poderiam se sentissem que de verdade fazem parte de um ecossistema maior.

Sair do organograma, colaborar com um novo projeto, apoiar a ideia de alguém, experimentar por algumas vezes não ter a última palavra, conectar pessoas da sua rede, almoçar com o trainee que acaba de entrar ou receber o novo fornecedor que você não sabe bem o que veio oferecer são pequenas açoes que geram valor, não só para você mais para o nosso ecosistema como um todo.

 

*Nathalie Trutmann se autointitula uma sonhadora, mas seu trabalho tem tudo a ver com colocar as coisas na prática. É diretora para América Latina da Hyper Island, Chief Magic Adviser da FIAP e está comprometida em motivar cada vez mais o empreendedorismo e o protagonismo pessoal na educação, assim como com a procura de implementar iniciativas que transformem a experiência educacional dos jovens. Ela lidera a parceria da FIAP com a Singularity University e é embaixadora da Singularity University para o Brasil. É autora dos livros ‘Manual para Sonhadores’ e ‘O Misterioso Significado do Dinheiro’ e palestrante sobre inovação e educação empreendedora. Formada pela INSEAD e pela Universidade da Califórnia – San Diego -, já percorreu e trabalhou em vários países do mundo antes de aterrisar no Brasil.

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