No empreendedorismo, se você quer paz… prepare-se para a guerra

20 de julho de 2015
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Muitos empreendedores ainda encaram a abertura de um negócio como algo romântico. É ingênuo pensar desta forma, por mais que eu defenda a causa dos negócios sociais, do capitalismo consciente e das B Corps. Si vis pacem, para bellum! Ou, para os que não entendem nada de latim como eu, “Se quer a paz, prepare-se para a guerra”. Você está preparado?

Una os termos guerra e negócio e alguém levanta a mão para falar de um livro que muitos conhecem, poucos leram e raros são os que leram mais de uma versão para formar uma opinião sobre o que é, de fato, a Arte da Guerra. Muitas listas dos “melhores livros de negócio de todos os tempos” trazem o manuscrito atribuído ao general chinês Sun Tzu, e a sua Arte da Guerra já foi adaptada para executivos, mulheres, concursos que mexeram no queijo do pai rico, e os que são contra os raios.

De todos os ensinamentos da versão original da Arte da Guerra, uma vinha sendo repetida por todos os executivos que acreditavam no si vis pacem, para bellum:

Se você conhece o inimigo e conhece a si mesmo, não precisa temer o resultado de cem batalhas. Se você se conhece, mas não conhece o inimigo, para cada vitória sofrerá também uma derrota. Se você não conhece nem o inimigo nem a si mesmo, perderá todas as batalhas…

Neste contexto, talvez nenhum empreendedor tenha levado Sun Tzu tão ao pé da letra como Sam Walton, fundador do Walmart. Quando ainda tinha apenas uma lojinha que vendia quinquilharias, Sam visitava seu concorrente da frente todos os dias de manhã antes de abrir as portas da sua loja.

Com isso, ele já sabia quais produtos expor, quais promoções fazer e com quais apelos. Hoje, as pessoas chamam isso de inteligência competitiva. Sam era um mão de vaca. Usava roupas compradas na própria Walmart, viajava de classe econômica e muitos falam que só colocou o nome de Wal Mart e não Walton Mart para economizar no número de letras dos letreiros das lojas.

Mas investia pesadamente em sistemas de informações quando computador era caro e coisa de cientista. Só o Pentágono do governo norte-americano tinha uma capacidade de processamento maior do que a da rede de Sam. Lenda urbana ou não, muitos já ouviram falar que há uma correlação entre fralda descartável e cerveja.

Bom…

Ninguém vende mais fralda e cerveja nos Estados Unidos do que o Walmart. Hoje, as pessoas chamam isso de Big Data. Por conhecer bem a concorrência e a si mesmo, a Walmart faturou US$ 421 bilhões em 2011, mantendo a sua posição de maior empresa do mundo.

Mas agora, várias empresas estão confusas porque já não conhecem a si mesmas. Muitas estão em crise existencial repensando seus propósitos e valores. O próprio Walmart entrou em uma cruzada a favor da sustentabilidade. Um dos fatores para isto estar acontecendo é ilustrado pela pesquisa da DMRH, consultoria de recursos humanos, que constatou que 40% dos executivos querem mudar de emprego, não só em função do dinheiro, mas pela busca de oportunidades com propósitos e valores mais inspiradores. Algumas empresas com políticas de bônus agressivas criaram inimigos que estão em suas folhas de pagamentos. Assim, o inimigo, em alguns casos, já não está só do lado de fora.

Daí a importância do conceito de guerra proposto pelo Pedro Chiamulera em seu post A Polaroid, Kodak, Nokia e a sua pequena empresa estão em guerra!  publicado no Blog do Empreendedor, no portal do Estadão. Quando ele finaliza seu texto afirmando que “às vezes é muito saudável, mas muito saudável sentir este estado de guerra. Senso de urgência! Reúna o teu time e grite alto: Estamos em guerra!”, na verdade, está se alinhando ao verdadeiro conceito de guerra travado por Sam Walton durante sua trajetória empreendedora.

 

Sam tinha um caderno em que fazia anotações, todas as noites quando fechava sua loja. Nele anotava exemplos de por que sua empresa tinha sido melhor do que ontem. Podia ser um faturamento maior do que no dia anterior (ou comparado ao mesmo dia do ano anterior), mas também podia ser uma promoção executada com sucesso, uma compra bem feita do fornecedor, uma nova oferta de produtos exclusivos ou, simplesmente, um agradecimento de algum cliente. Ser melhor do que ontem era sua verdadeira guerra! E todas as empresas e empreendedores travam a mesma guerra, goste você ou não do colosso que virou a empresinha fundada em uma minúscula cidade chamada Bentoville por um caipira que pegou dinheiro emprestado do sogro para fundar uma loja que só vendia itens de cinco e dez centavos.

 

Marcelo Nakagawa é diretor de empreendedorismo da FIAP, além de atuar como professor de empreendedorismo e inovação nas principais escolas de negócio do país. É membro do conselho da Artemísia Negócios Sociais e da Anjos do Brasil, mentor do Instituto Empreendedor Endeavor, coordenador acadêmico do Movimento Empreenda da Editora Globo, colunista do Estadão PME e da revista Pequenas Empresas, Grandes Negócios. É pesquisador do Núcleo de Pesquisa em Gestão Tecnológica e Inovação da USP. Possui mais de 20 anos como executivo, tendo atuado nas indústrias financeira/bancária, consultoria empresarial, venture capital, inovação e private equity. É doutor em Engenharia de Produção (POLI/USP), mestre em Administração e Planejamento (PUC/SP) e graduado em Administração de Empresas. Autor do livro Plano de Negócio: Teoria Geral (Editora Manole, 2011) e co-autor dos livros Engenharia Econômica e Finanças (Elsevier, 2009), Sustentabilidade e Produção: Teoria e Prática para uma Gestão Sustentável (Atlas, 2012) e Empreendedorismo inovador: Como criar startups de tecnologia no Brasil (Evora, 2012).

 

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