O poder e encantamento do “papo learning”

20 de outubro de 2015
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Por Nathalie Trutmann (*)

Recentemente recebi vários insights sobre inovação (sim, essa palavra tão batida) no formato mais eficiente que conheço hoje – o velho e conhecido encontro com o único propósito de botar a conversa em dia. Interessante observar que esse negócio de peer-to-per-learning que tanto está sendo promovido pelos modelos educacionais mais “inovadores” está transcendendo cada vez mais idades e fronteiras, mostrando um resgate do básico, do diálogo interpessoal. Na minha experiência, esse “papo learning” está ganhando cada dia mais valor, mesmo que pareça caótico (como talvez possa parecer este texto) porque não segue o traço linear de um currículo.

Essa troca pessoal consegue refletir mais autenticamente os fragmentos do que está acontecendo no mundo real. Para mim, o número mágico é o 2 – mesmo que o 3 e o 4 também possam ser números bons, nunca conseguem ir tão a fundo como só um “tête-a-tête” consegue. Talvez porque o palco (virtual e físico) fica automaticamente restrito ao olho no olho, o único que consegue desarmar as múltiplas imagens que nos acostumamos segurar no dia a dia, conseguindo o que todos no final do dia ansiamos: a conexão real.

Um desses “papos learning” recente que tive foi com Joakim Jardenberg, palestrante e empreendedor sueco que se autointitula “CEO Whisperer” e que já participou do começo de startups revolucionárias como o Spotify. Ele foi convidado para palesrar em um evento aqui em São Paulo e foi fascinante testemunhar como, mesmo com toda a tecnologia e grandes nomes apresentados, ele conseguiu capturar o coração do público em um milésimo de segundo (e fazê-lo desgrudar os olhos das telas dos celulares) com duas imagens simples e poderosas. Uma da Iris, menina de menos de um ano deslizando seu dedinho para destravar o iPhone do pai, e outra com as diferentes pessoas que postam selfies deles mesmos lambendo seus celulares.

“Observem. Tem algo acontecendo aqui. A gente não costuma beijar qualquer coisa. Não se trata mais de estarmos on-line ou não. Para as gerações como da Iris, isso simplesmente não existe” questionou enquanto se ouvia o som que tínhamos de suportar nos anos 1990 quando tínhamos de discar para ficarmos on-line.

No almoço pós-evento, ele comentou como a coisa que mais lhe chama a atenção é a nossa capacidade de esquecer de nos surpreender. “Exigimos magia a cada instante. Vindo para cá, eu fiquei bravo porque o wi-fi no avião não estava funcionando e eu não conseguia acessar o Netflix, esquecendo por completo que estava suspenso no ar atravessando um oceando. E esta tendência de nos vangloriar constantemente nas mídias sociais está próxima de chegar ao ponto de saturação. Inevitavelmente as pessoas vão querer ir mais a fundo. É uma questão de sanidade mental”.

Mas quem está fazendo algo diferente? Perguntei frustrada como tantos com o efeito Branca de Neve que parece ter tomado conta de todos. Jeff Jarvis, disse ele ao se referir ao reconhecido jornalista que por tanto tempo segurou sua imagem de super tech savvy (com Buzz Machine e seu livro What Would Google Do?) e hoje passou a usar as mídias sociais para compartilhar seu lado humano e sua jornada lidando com câncer de próstata. Quem mais? Às vezes Gary Vaynerchuk do WineLibrary deixa escapar alguma ou outra coisa, mas ainda são poucos, diz ele.

“E tem outro assunto, igualmente preocupante”, continuou. “Como conseguimos lidar quando um país como o meu (Suécia) escolhe como a pessoa mais influente, acima da rainha, uma blogueira de 13 anos (MissLisibell)?? Quais são as nossas responsabilidades quando colocamos o holofote sobre esta jovem pré-adolescente?” Não faço ideia, respondi, pensando na nossa recente geração de jovens digitais.

Encerramos nosso almoço comentando como vários eventos poderiam se beneficiar se começassem a mudar o formato para acomodar mais tempo e recurso para as conexões poderem acontecer, ao invés de tentar preencher cada minuto com palestrantes e conteúdos que infelizmente ninguém mais tem paciência para assistir sem ter uma conversa paralela via celular ou nos bastidores. E com ajuda de um ou mais hosts experientes que pudesse ajudar a criar essas conexões tão valiosas.

Nessa linha começou outro dos meus “papos learning” recentes com uma das pessoas e empreendedoras mais visionárias na área de educação que eu conheço – Ana Gabriela Pessoa. “Existe uma dificuldade hoje de se criar espaço na agenda para poder pensar e ser criativo, algo fundamental para realmente inovar e para conseguir atrair os executivos que você precisa. Temos começado a contratar sem ter uma vaga específica. Se achamos alguém com muito potencial, contratamos porque a verdade é que não sabemos o que vai ser construído ainda, as ao menos já temos uma ideia do tipo de profissional que vamos precisar”.

“Uma das coisas mais interessantes que tenho visto é que em algumas das escolas tem um negócio chamado ‘o canto da paz’ – quando acriança está tendo um desses dias no qual não consegue gerenciar suas emoções, ela é levada para o tal ‘canto da paz’ para recuperar seu norte” diz ela. Certa vez, ouvi que existe uma escola infantil onde há um ritual semanal também muito curioso. A turma faz um círculo ao redor de um colega e cada um deles tem de cumprimentar quem está no meio do círculo – começando a exercitar desde os quatro anos de idade a arte de aprender a dar e receber feedback positivo.

“Mas você sabe o que mais tem me impressionado? Você já ouviu falar do Soul Cycling?” perguntou ela. Não, respondi, mas já gostei do nome. “Foi criado por esta mulher que teve filho e queria malhar para emagrecer, mas não gostava do formato das academias que existiam. Então criou sua própria marca de spinning e é hoje a maior febre. Tem até camisetas com a marca Soul Cycling – é toda uma experiência, você pode escolher se faz a aula com jazz, rap, hip hop… E você sai totalmente encantada. Até eu que não gosto de spinning, adorei”

Infelizmente, tivemos que nos despedir às pressas, mas não sem antes comentar que tinha um forte insight dentro de tudo isso – o tal do Customer Experience – nada novo, mas tantas vezes esquecido. Dentro de todo o barulho e narcisismo de hoje, há novas necessidades e oportunidades surgindo para gerar valor verdadeiro para as pessoas. Talvez, começando por um “canto sem o espelho”, onde você é enviado a cada vez que seu ego começa a tomar conta de você e das mídias sociais, gerando conteúdos que não agregam mais valor para a sua comunidade.

(*)Nathalie Trutmann é diretora-geral para América Latina da Hyper Island, embaixadora no Brasil da Singularity University e chief magic advisor da Fiap

 

 

 

 

 

 

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